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Durante quint.e dias seguidos foi

necessArio repe1ir

a

opera¡;:lo e a ferida

cicatrizou. Mas André ficou coxo.

Coxo, portante inU.til. Sbmente a cari–

dade do patrao

e

os bons se01imentos da

Ra Blanquita lhe valerem para ficar no

seu huasipungo. Melhor ainr1a, um traba–

lho de

chacracama

(1)

foi-lhe confiado

até se curar completamen:e.

Empoleirado num miradoiro, teria

simplesmente que velar dia e noite pelas

colht:itas. Era um trabalho de criam;a de

oito anos; enfim, até que !he fosse dado

melhor, era preciso aceitar aquilo; pelo

:~~oQ

0

~éA~~:

5

~udesse

trabalhar, afir-

- t

ate que o guagua esteja crescido.

O leite da mulher convinha-lhe, concluiu

D.

Branca.

-E'

urna boa India.

E

André passou os dias e as noites

numa cabana colocada no meio dos cam–

pos de milho, a lan¡;ar gritos próprios

para afugentar as aves. Porque, a menor

negligéncia, os bandos de papagaios ver–

des baixariam sobre as Cfllheitas.

- Eaaaa

!... ,

gritava o inválido do

alto do seu observatório e os papagaios

fugiam.

,

Urna noite os Indios dos huasipungos

da colina, viram urna multidii.o de ¡umi-

~:~~;~spr~~ip~~~h!e ~~ ~o:j~~~~eoa;a3~

arrombara os currais.

Um grito rompeu o silencio e as

trevas.

-Estragos.,, para a fazenda. Vozes

descerlm da colina e despertaram a

paisagem adormecida.

Apesar de todos os esfor¡;os, o pe

coxo tinha imped1do André de chegar

~s¿~~f¡~~

r:

n~:a;od~b~=s a~;m:~~~eq~~d~~

ram enfim ser repelidos, a ferida recém–

-cicatrizada abriu-se de novo.

Os gritos acordaram Dom Afonso, que

deitou um poncho sobre as costas e safu

da galeria. Fez levantar todos os criados

e

or.dc:

nou-lhes que fossem ajudar os

chacracamas. Os castigos seriam para o

dia seguinte.

Encostado a um dos pilares da

~ale­

ria pas::-ou um longo momeuto a refletir.

Levantar-se no meio da noite nao era

coisa vulgar. lsto provava que ele era

homem trabalhador. la tirar disso um

legilimo orgulho contando-o nas reu–

nióes do clube. Seria o assunto das con·

versas, a mistura com as chávenas de

chocolate, na Sociedade dos agricuhores

de que fazia pane. lmaginou os seus

companheiros tremendo diante da nar–

raüva de um tal acontecimento, porque

era bem um . acontecimento. Sentir-se

a..l>im pei'dido nas trevas da noite, em

plena montanha, é mais terrlvel do que

perder-se na alvura dos geles polares.

- Estou certo, conclulu ele, de que

sou o homem mais trabalbador da regiao,

a cabe(fa de toda a multidiio de traba–

lbadores, o guia, a luz..• Sem mim.,

Sem miro, nada se faria.

O inverno chegara de novo.

A familia Pereira decidiu regressar a

capital. D01ia Branca e Lolita queriam tudo

arranjado; pelo coñtrário, IJom Afonso

náo sabia como comeyar o relatório sobre

os seus trabalhos,·em vista da explorayii.o

da

~a~:~~en~:ol~nae~~dizia

Doña Blanca

para o consolar.

=

~~~oqu: ~~e:e~P~sqf~t~uj 1~~~d:é~!

compraste todas as montanhas do Orieme

por um bocado de pao? Nao se podia

fazer mais em tres anos.

(1)

fndio encarregado de 9igiar os campos.

A SEP U LTURA DOS INDIOS

- E a estrada e os huasipungos e tudo

o

mai~ ?

-lsso vira depoi!l. Voltaras só ecome–

prás os trabalbos.

É

preciso que pagues

urna parte das dividas e urna parte dos

impostes. Os teus negócios marcharam

bem nesta Ultima estayao.

O secreto desejo de Doña Blanca, era

voltar para a cidade, voltar as novenas

da Virgem de Pompeia, as su.:s jóias, as

suas amigas, ao pai Uzcategui. E convc:n–

ceu o marido. Quanto a este, ao fim duma

semana, já eslava bem saciad'! dos pra–

zeres da capital e, tendo receb1do novas

instruyOes do tio Júlio e da sua sociedaóe,

o bravo homem. escoltado por dois Indios

e montado sobre a •Negra.t, tomou a

estr;~da

do sul

.

Chegou

a

aldeia depois do meio-dia.

A

Joana, que nesse momento, vendia

debaixo da galeria a

chicha

(1)

e a sopa a

urna dúzia de Indios sentados ao sol,

recebeu·o com um

ilé

(2)

de sorpresa.

- jacintouo

1

Olha, o senhor está aquí.

E veio sOzinho ?

O campones colocou o cigarro meio

queimado sobre um canto do baldio e

sa!u da loja com o mais amável sorriso

que a sua cara gorda e queimada lhe

per~

mitin.

-- Apeie-se, pois, da mula, Senhor.

Vai !icflr bem bebendo um copo. Náo está

no deserto]

- Obrigado, meu filho. Agora manda

o teu rapazito dizer ao cura, para chegar

aqui. Tomara um copilo comigo.

- A's suas ordens, senhor.

-Porque esperas para o mandar

entrar ? Nao vflo ficar a faJar na galeria,

disse a mulher.

lnstalaram-se num compartimento

que servia de quano de dormir a fami–

lia Quintana. Um quarto com o cbiio

coberto por urna esteira, e comas

par!!~

des forradas com jornais e ilustracOes de

revistas amarelecidas pelo tempo. A' cabe–

ceira da cama erguia-se um altar a Vir–

gem rodeado por urna centena de imagens

santas, prenda que o Jacinto exigía aos

farmaceuticos quando ia a Quito buscar

os remédios, de que era o revendedor

na aldeia.

-Sen

te~

se.

- Aqui, em cima da cama, parece-me

melhor. Se nos

embriagarm~,

niio pre–

cisamos de mais nada.

-Eh lá, eh lá! Quem é que fala cm

beber? perguntou a mulher entrando com

um prato de omeletes e de mi\ho frito

acompanhado de pimentinhas.

- Tomem, .. Comam. E para beber

o que querem,

cl11chu?

- lsso niio, faz me mal.

-Nao é da

chicha

dos Indios, fermen-

tada .com o sumo de agaves.

E.'

da outra,

da

chicha

de milbo.

-Preferiría um copo de cerveia. As

pimentiñhas sao fortes.

- Cerlamente 1 Mas nós nao ternos

sen~o

da Mona. A da Campana fer1nenta

imediatamente, e como aqui nii.o se vende

muito, fareis melhor em beber um copi·

nho para boa digestiio.

- Obrigado, e diz aos Indios que estáo

al fora, que se podem ir embora mas que

me deixem a mula.

O aspecto sorridente do cura deu a

conversa um tom familiar e agradável.

- O\á! Dom Afonso, que há de novo

lá por Quito?

-Nada de interesse. Entáo onde está

o copinho que me ofereceste?

com

0

o

~~dfs~u~a~s~~ll~eh~~~~a:fe~~:;rre~

patrao.

Amavelmente, o proprietário serviu

os copinhos em volta. O tom da conversa

subiu. Dom Afonso sugeriu o problema

da estrada:

(1) Bebida para acalmar a sede dos fndios,

preparaf!a com milho Oll urroz.

(2)

Exc1ama~¡:Ao

de Sllrpresa,

-Somos nós os Unicos que podemos

empreender urna tal obra. Vece do cimo

do púlpito e eu no comissariado. E' uma

obra verdndeiramente patrlotica e deve

ser discutida o mais depressa pos.1.!vel,

a fim de, no momento precil>o, se pode·

rem reunir todos os homens da aldeia.

Eu, cedo os Indios das minhfls proprie–

dades. Estou cerio que ao fim do:: tres

s~:manas

a estrada estará Construida.

O ministro ofereceu-me a ajuda dum

engenheiro, para que esta obra de in te·

resse geral seja levada a bom termo.

Se nós nao n'!s reunirmos, o pals nao

poderá dar mats um passo para

a

civili–

za¡;ao.

• Mas ..• bebei pois, interrompeu

D.

Afonso. Os ouvintes pareciam presos

das suas palavras.

- A' vossa saiide.

- A' vossa saúde.

- Chegou o momento de trazer a civi-

lizafVáo aos habitadtes destas regiOcs. Os

caminhos sio a vida dos povos. (lsto lera

ele em qualquer panc•..)

A

sua frase, salda assim a propósito,

encheu-o de orgulho; fez coma milo um

gesto brusco.

-Mas o senhor ju\ga seja possl–

vel fr.zer vinte quilómetros de

e.~trada,

~ueent! :O~i~

1

t!

1

~~¡? otJ:c~oo: ~a~~~·a~nica-

- Eh 1 Entio ignora que a estrada de

S. Gabriel a .Fulcar se fez com cinco

mobiliza~Oes

e que hoje essas regiOes se

valorizaram em cinquenta por cenlo?

Saiba, pois, que por urna propriedade–

zinha que um dos meus parentes lá tem,

!he pa!!ar¡tm cinquenta mil sucres.

- Magnifico! exclamou o cura, trans–

bordante de sU.bita alt'gria, porque urna

ideia acabava de lhe passar pela mente

e náo pOde conter-se. Poderemos come–

yac no próximo ve"rao, pela festa da

Virgem.

-Como queira, respondeu D. Afonso,

num piscar de olhos.

- Niio... nii.o

é

pela razii.o que supOe,

mas ünicamente porque os Indios e os

trabalhadores se semir3o assim protegi–

dos pela muito Santa Virgem e trabalha·

rio com mais ardor.

- tura malandro... E os cem sucres

que tu obterás dos Indios para a !esta?

-Mas, bem entendido será uma festa

como jamais houve memóda. Tal como

a estrada. ,.

-Ora! Desde que náo escolhas como

dador a minha fazenda.,.

O jacinto Quintanl'l, sentindo o seu

patriotismo sem emprego, interveio:

-E entilo eu, como poderei ajudar?

-Tu serás o cobrador. Recolherás o

que o papá cura tiver semeado. Serás o

recebedor do gado. Ah... Ah... Ah .•.

Reunirás os trabalhadores de bom ou

ma

u_

g~~~o~~.s~zrnh~a?

missao.

- Patife·•.• Tu só terás que aprovei–

l tar o momento oportuno. Por exemplo,

no decorrer de urna festa.

-~·que

.. , objectou o campones, como

se lhe tivessem pesto a verdade a frente

do nariz.

Jóana entrou coma última garrafinba

de bebida, enquanto Dom Afonso pergun–

tava:

- Quantos, na vossa opini1io, adeririio

voluntariamente a finta?

-Bastan tes, responden o cura,

enquanto jacinto ordenava a mulher que

preparasse agua de canela.

-!-.las quais? gritou Dom Afonso com

urna voz alcoólica.

Todos os habitantesf(la regiiio desfi–

laram; o vdho Calupiña, o marchante de

carneiros; o Melchior. com os seus dois

belos filhos; Cuso, o telegrafista; Timó–

teo, o mestre escoJa, todo curvado que

passava o tempo a zombar dos galos do

s_enhor cura, porque o seu galo cint.ento

ttnha ganho cinco combates¡ o sfmio

choramingas que vivia queixando-se das