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Desde enliio os aldeOes n!o tentara

m

msis

abandonar

a

estrada, antes que os

1

eus vinte e dois quilómetros se esten–

dessem ate ao melo dos pAntanos e dos

desUladeíros.

Quanto

R

Do

m

Afonso jamais !he ocor–

rera a idein de que os seus esfon;os parn

c.onduzir a obra, que acabava de ser rea–

lizada.

poderiam encontrar eco na capital

e valer-lhe a mais gloriosa

da~

reputa–

.;Oes. Foi o primeiro

a

ficar surpreendido

com a \dtura das colunas inteiras de elo–

gios que lhe eram dedicados; as fotogra–

fías da

h~róica reali:t:R~il.o

ornavam a pri–

meira página dos jornais da Repíiblica

tr:ndo

no

primeiro plano o proprietlirio,

o cura, o Jacinto, o vesgo Rodríguez e os

irmños Ruata. No segunrto plano apare–

ciam os habitantes de Tomachi, repre–

sentando

a

massa dos tr..

balhador~s.

Quanto aos Indios. nao resta dlivida, que

n4o

esuwam presentes no momento pre–

ciso em que os fotógrafos operavam.

Dc:!';penteados

e

imundos, nao foram jul–

gados dignos de \figurar no palco da

glória.

*

estd::n~i~~a~~b~~ca~~~g~~jod~

8

:i~.p~~~~

reputa~ao

de ser rico. Sem díivida por·

:~~C~li~

1

shad~

0

1~

0

d~nl~s!eiaiS:,an~

0

fu¿::'~~

sua cabao:'!, possuia urna boa capoeira e

urna vaca com

um

vitelo. Talvez, também,

porque tinha sido designado benemérito

para a

se~unda

festa

d~ ac~iio d~

gra–

~as

oferecida pela alde1a

~

sua V1rgem

padroeira. Efectivamente era ela quem

tinba permilido acabar a grande obra

nacional empreendida.

Cabascango entrou com alguns com–

panbeiros, o

~ndré,

o José Tacbi, o. Me\

4

chior, o Ach1gre- e outros na lo]a da

mulher do Jacinto.

O

futuro doador pediu

dois reais de guarapo e todos beberam,

ll

pressa, porque precisavam de encon–

trar o senhor cura, para tratarem da (esta.

Bruscamente, o barulho do rio enC'heo

,a planicie.

O

bramido a\ongava-se e a voz

amea~adora

da montanha inteira fazia-se

ouvir pela boca do barranco por onde

corria a torrente.

Os Indios assustados levantaram a

cabe~a

e

sentiram o

:~proximar

da tragé–

dia.

A

brisa, carrl!gada de u

m

odor de

terra revolvida, elevou-se.

- A

cbeia! gritou um deles. Centenas

de vozes desesperadas ecoavam no vale.

En~uc:ue~~i~os,

os Indios sairam das

cabanas com os guaguas.

,A'

sua volta, as

coisas tomaram um aspecto terrlvel.

A

Agua 111macenta quebrava-se com fragor

de encontro

~s

rochas nuas das margens.

Ao longe, ouvia-se o enorme rugido do

rio. De toda a parte surgiam

~ndios

que,

!~

1

!:~~

0

cat~~

0

a~,d::~6ri~~~~s~~~~n~~:.~~

O

~co

repercutía os gritos, amplificava-os,

multiplicava

4

os. A

é.~ua

barrenta lambia

jé. o solo das primeiras cabanas. Todos

tinham a vista como que preR:ada sobre

as

vagas. NAo havia obsto\eulos para elas.

Por instantes

u

m grito ressoou acima

do tumuhu. Era de urna India que só

enti!.o se lembrara que tinha deixado, na

fuga precipilada, o seu pequeno guagu.a

oa cabana. Era demasiado tarde. Desa–

too a

~rilar.

Inüh-is, os gritos ecoa–

vam sobre a superlfcie das aguas lama

4

centas, das liguas que cobriam as margens

e cre,.ciam impiedosas, todas cobertas de

e'puma.

- Ai

1

Ai

1O

meu pequen

u

estli lá e

m

bai.~:o.

- Ai 1O meu dio está lá em baixo.

A SEPULTURA DOS INDI OS

- A.i 1 O meu pai

est~

lá em baixo.

_A

ligua crebcendu, OQdulava e prosse–

gu¡a o seu curso ante

a

multidiio

aterr~tda.

Urna porta de estrebaria elevou-se por

momentos no come duma vaga. Oepois

seguiu o movimento da onda que se abriu,

fechou e se abriu de novo; cada vez que

a fix11vam com os seus olhos embrute–

cidos, os lndios estremeciam.

Urna cabeleira apareceu na torrente

tumultuosa. Os Indios tentaram

Jan~ar

um

la.;o que tocou o turbilhiio e se perdeu

nos tufos de ervas que a corrente tinha

arrancado.

- De quem será este guagua?

-Talvez do Tim6teo.

-Ou do José.

- Ou do Manuel.

-Ou da mulata.

Depois, um siléncio

abafadi~o

caiu

sobre

a

muhidii.o. A cheia, implacivel,

arrastava na espuma e na lama cabe¡;as

de gado, cabanas demolidas,

crian~as

e

alguns Indios surpreeodidos na passagem.

De repente alguém exclamou:

-Vamos lá abaixo ao vale:

o rio

estende~se

por toda a parte. Forma urna

praial

-Vamos!

-Vamos-!

O circulo de terror que os mantinha

unidos desapareceu ante a

esperan~a

de

salvar ainda alguma coisa. Ansiosos,

obse~

cados, inconscientes, precipitaram·se

desordenadamente. Desceram o declive,

caindo, levantando-se, voltando

a

cair,

levantando-se ainda. Era urna correria

louca

A

procura de crian,as, velhos, res–

tos de buasipungos. Corriam através dos

campos de milho, dos pomares, saltando

por cima dos va lados.

Diaote dos pantanos, a sua energia

duplieou

4

se. Pouco lhes importava agora

afundarem-se na lama até os joelhos;

pouco !bes importava entrarem na água

até. lis ancas -a agua da cheia que tinha

entulbado as mais pequeoas depressOes

de terreno- pouco !bes importava a dis·

té.ncia. Tinham

a

certeza de encontrar

alguma coisa do que !bes tinha perten-

cido.

No sitio onde o rio nao tinha margens

e se espraiava no vale como um trapo la–

macento, encontraram cadáveres, destro–

~os

que flutuavam sobre a torrente

<~mai~

nad~t.

Por entre

lameota~óes

sem fim,

entraram na lama até

ll

cintura para de

lá sairem alagados. Nas caras das vlli·

mas, a tragédia da morte tinha deixado a

sua marca. Nos olbos abertos lia-se a

mesma express3.o de espanto. Entiio, os

sobreviventes puseram-se a chorar e,

quando a noite calu, os solu(fos nao

tinham ainda terminado.

SOmente o grupo dos Indios que tinha

acompanhado Cabascango nii.o se

deix.oo

arrastar para o vale. Nenhum deles tinha

ainda ousado esbo,ar um gesto e ('sta–

vam ali, pa!imados, como sb formassem

urna assembleia de cadáveres. O José

Tachi, o .Melchior Achig,o Leonardo Taco

e Cabascaogo, niio acredita\•afu no que

viam com os seus pr6prios olhos.

0.!1

habitantes de Tomachi

e~peraram

duran le algum tempo o plio, a vida fácil

e o pi-ogreuo que lhe tlnham prometido

aqueJes que os tinham induzido a traba–

lhar na er;trada. Dc:poit perderam toda a

uperanc;a.

E,

durante esse lempo foram

felize!l. Urna ideia com efdto nlo os

abandonava : a das felicidades fu turas

qoe os e¡..peravam.

Eles e os Indios tinham construido a

estrada que !le estendia como

urna

tatua–

~em

ao pé da montanha. O senhor cura

Lomas, tinha comprado dols camiÓc:.!l e

urna camioneta de: passagdros.

A

viagem

eostava um sucre por pe.!lsoa e cinco

reais por um quintal de mercarlorias.

E os almocreves, que constituiam nove

lB

d~clmos

da

popui11~Io,

era

m

abandonados

com

as

~ouas

mulas nas mangc:doiras.

Para

e~ttes

u:io havla m;,is carga a tra–

zer nem ma1s comissOes a fazer.

E

nin–

gue.m p11ra comprar as mulas.

- <.:aramha

1

murmurou Melchior.

Co~ava

a

cabe'::~

diante da portll

d<~.

sua

cabana ao recordar a sua vida de almo–

creve. Via·se ainda trazendo de: Quito

os guaguas que, com

HS

suas blU!>il§ de

cor, ornadas de rendas sobn: o pei1o,

fatiam a

admira~llo

de toda a

viúnhan~a.

Agora, nao tinha nada com que alimentar

os mai11 novos, os único' que Jhe rc:stavam.

0!1

grande1<

1

nllo querc:ndo pa ..sar fome

em casa, tinham fugid<A:om

o<~

criados

da aldeia que, nAo tc:ndo trabalho, o i<om

procur11r a Quito.

-E

eis para o que

a

e1otrada nos ser–

vi

u, murmurou em voz alta. A .. rilhas rte

.Júlio e de Alllon, nll.o tardar!o a br:guir

o mesmo cam1nho que a!> mlnhas.

As

mé.s

linguas

aflrmav<~m

que duas

~~~~r~~l ~~e~~~~~~. ~~~~¡¡;;C~~~¡¡~ d:il~¿~::

um pouco ma1s-1arde,

cm

San Oiego com

a

negra loácia. l.!>lo era,

<~lih,

m...

is que

veros!mil. Quando a Dvlorita.. vinha ver

os p11is quase todas as semanas,

tr~ozi::~

a

cara pintada e podia

permttir~se,

ofc:recer

a sua mae trt:s ou qu<>tro sucre<;, com

que alimt:ntar os

gu~tguas.

E

nln¡.;uém

• lhe fahtva do marido e oinguém penuva

em !he perguntar donde vinha o dinhdro.

0.!1

labre~os

examinavam os campos :

-O

p~ttrl!.o

v&i ter agora unHt bela

colheita. Conquanto que ele nos d! boae

ajudn", a

nó~;,

os pobres. Com

a

cheia,

nós ficémos se-m nada.

:J

- Entiio, qut!rem levar a vida a pen

4

sar nisso"?- interrompea Policarpo.

Os l&bre¡!;oS sob a direc.;l!.o do mor–

domo, abriam urna brecha na cintura

doli campos de cevadn. Depois de tt-rem

bebido Um grande copo de aguardente,

voltaram a ceifar.

- Quando tiverem

se~

e nao ttm mais

que vlr beber u

m

tr&J!:O de1-ota boa chicha,

disse o Polic8rpo, ins!alando·se sub re os

barris, enquanto os aldr:ót!s

~;e

embre–

nhavam no imenso campo de cevada,

Inclinados para as

e~ptgas,

manejavaro

as foices como mandibulas dt:

ferro.Com

os rins doridos, apetecia-lhes levanta–

rem-se nem que

fos~e

por um segundo;

levantarem

4

se e, com as mlios na cintura,

espregui~arem

4

se.

Mas a voz avinhada

do mordomo, sentado nos barris como

um

chacracoma

encarregado de espan1ar

os pá<;saros do tecto da sun cabana de

madeira, tornava imposstvel a menor

pausa.

-- De!lpachem-se, caramba!

Os corpos inclinaram-se ao mesmo

tempo como que dobri!dos por um fura–

clio. As foices tornavam·se cor derogo,

os dorsos escorriam suor, o sol mordia

as espllduas como um ferro em !Jras:t,

E

a chicha agravava

a

sede.

Ao meio·dia, montado na •Nrgrn,

o

patrao apareceu na orla do campo. Sobre.

os barris, o mordomo meio btbado dor•

mitava.

- Olhem para isto, caramba

1

Eis urna

bonita maneira de vigiar, e.xclantou

Dom Afonso ioterrompendo o sono de

Policarpo.

- Patrlio, patrlio! gaguf]ou o homem

levantando-se

mas

sem pc:rceber alnda

donde vinba a voz.

- OJhem para ele, caramba

1

Nem

sabe o que lhe vai acontecer. Dormías,

hem?

- Nlio, patrlio, isto agora vai melhor.

-Como

e

que a chicha bá.-de cht·gat'

para toda a sega

1

- Há

muitos Indios que chegar:tm

para o trab11lho, patrl!.o.

-E' preci1io que hlo acabe. Eu estO\\

decidido a nio d1spender nem mais um